LUANDA, 28 de agosto — Como parte do discurso do presidente Lula em sua visita à capital angolana, o mandatário prometeu que o Brasil voltaria a investir no país africano que já se viu envolvido em grandes escândalos de corrupção, desvios e tráfico de influência, escândalos esses que chegaram a congelar investimentos brasileiros via BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) em obras realizadas por empreiteiras brasileiras há menos de uma década.
De acordo com uma reportagem do Estadão, na última sexta-feira (25), CEOs, presidentes e representantes de empreiteiras, entre elas a Novonor (Odebrecht, que mudou seu nome), Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão, se reuniram com o ministro da Fazenda Fernando Haddad no hotel mais luxuoso da capital angolana, o hotel Intercontinental.
O edifício do hotel, que foi inaugurado em 2020, pertencia à filha do ex-ditador angolano José Eduardo dos Santos (comandou o país por quase 40 anos, deixando o poder em 2017), Isabel dos Santos, e foi recentemente tomado pelo Estado de Angola (que continua sob o comando do partido socialista Movimento Popular de Libertação de Angola – no governo há 49 anos).
“Vamos voltar a fazer financiamento para os países africanos. Vamos voltar a fazer investimento para Angola, que é um bom pagador das coisas que o Brasil investiu aqui. Angola sempre foi um país que nos deu certeza que cada dólar investido aqui seria ressarcido e assim o fez. Angola é importante porque Angola dá estabilidade. Eu vou repetir: Angola paga. Angola não vive devendo” -presidente Lula em discurso sobre investimentos em Angola, no Foro Empresarial Brasil-Angola
Isabel, a “mulher mais rica da África” (retirada da lista da Forbes por conta da origem ilícita do dinheiro), encontra-se na lista vermelha da Interpol com ordem de captura e vive “escondida” em Dubai, apesar de realisticamente ser uma influencer de internet com milhares de fãs (só deixou o país no fim do ano passado para assistir à jogos da copa do mundo no Qatar – sem maiores problemas e usando camisas da seleção brasileira).
Mesmo com o mandado de prisão e o fato de não poder viajar por aí, Isabel está desde o início deste ano em uma batalha judicial para tentar construir um hotel 5 estrelas na capital portuguesa Lisboa*
Apesar do discurso do presidente Lula sobre a retomada de investimentos no país (decisão política que espanta aliados no Congresso), somente a Odebrecht, em acordo de leniência nos EUA, confessou o pagamento de quase US$ 1 bilhão a políticos e servidores de 12 países, incluindo Brasil e Angola.
De acordo com o Estadão, que entrevistou Haddad sobre o tema, o ministro, sabendo da polêmica que o movimento causaria, teria orientado que os empresários “manifestassem seus interesses e necessidades por meio de uma carta à sociedade, ao Executivo e ao Congresso” e falassem sobre como seriam adotados “mecanismos de transparência e controle, a fim de evitar novos escândalos de suborno e pagamento de propina, seja no Brasil ou em Angola”, para que o investimento não fosse barrado pela ala política.
Apesar do ministro dizer ao jornal que não discutiu valores com os empresários, as pessoas que participaram da reunião confirmaram que o valor discutido seria de iniciais US$ 100 milhões.
Envolvida em escândalos em diversos países, em Angola, a construtora Odebrecht chegou a se tornar a maior empregadora privada do país. Documentado, o Brasil investiu no país mais de R$ 16,5 bilhões.
A única etapa que estaria faltando para o negócio ser concretizado seria a questão das garantias de pagamento, já que o país se comprometeu com o FMI (Fundo Monetário Internacional) de que não usaria mais suas reservas de petróleo, como sempre fez.
Partes envolvidas nas negociações dizem que a linha crédito que está sendo criada será exclusiva entre Brasil e Angola (devido aos calotes que o Brasil levou de outros países).
O atual presidente angolano, João Lourenço, no poder desde 2017, além de dividir o mesmo partido do ex-ditador, foi escolhido pelo próprio José Eduardo dos Santos.
O atual presidente angolano já foi citado em uma delação no Brasil pela esposa do marqueteiro João Santana, Monica Moura, que diz ter pago, em 2012, US$ 15 milhões para a agência de publicidade “Orion”, que tinha João Lourenço como um dos seus sócios e pertencia à sua esposa, Ana Dias Lourenço.
O dinheiro teria como origem o partido MPLA e a construtora Odebrecht (remuneração pela obtenção de contratos).
Na época, a construtora tinha oficialmente até minas de diamante no país.
(Em atualização)