Novas mensagens da equipe de Moraes, obtidas pela Folha, mostram seus juízes auxiliares conversando sobre “vontade de mandar uns jagunços pegar na marra” um jornalista brasileiro nos EUA

Ministro Alexandre de Moraes | Imagem por Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

BRASÍLIA, 18 de agosto — Em mais um diálogo divulgado pela Folha de S. Paulo, extraído dos mais de 6 gigabytes de mensagens e áudios trocados por auxiliares de Alexandre de Moraes, juízes auxiliares do ministro manifestaram, em tom de desabafo, sua frustração com a falta de ação da Interpol e do Governo Americano em relação ao jornalista brasileiro Allan dos Santos, que reside legalmente nos EUA e desde outubro de 2021 enfrenta uma ordem de prisão emitida por Moraes por “ameaçar autoridades, praticar crimes contra a honra e incitar a prática de crimes”, sugerindo até uma “vontade de mandar uns jagunços pegar esse cara (o jornalista) na marra e colocar num avião brasileiro”.

A polêmica troca de mensagens teve início em 14 de novembro 2022 entre o juiz Marco Antônio Vargas, do gabinete da presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e o juiz auxiliar Airton Vieira, braço direito de Alexandre de Moraes no Supremo, em um grupo de WhatsApp, após um vídeo do jornalista Allan dos Santos em Nova York ter viralizado no Brasil.

O juiz Marco Antônio Vargas começou a conversa enviando mensagens e um link do vídeo que teriam sido enviados pelo próprio ministro Alexandre de Moraes.

— Juiz Marco Antônio Vargas (TSE) –“Peça para o Airton falar com a PF sobre o alerta vermelho [da Interpol]”

A mensagem foi respondida pelo braço direito de Moraes no Supremo, o juiz Airton Vieira, que afirmou ter acionado o representante da Interpol no Brasil e o adido brasileiro em Washington para que tomassem as providências em relação ao jornalista.

Questionado se o nome de Allan havia sido incluído no alerta vermelho da instituição, Airton disse que o pedido foi não havia sido atendido.

[Áudio] — Juiz Airton Vieira (STF) –“A questão do alerta vermelho é uma longa história, mas em resumo é o seguinte: o pedido do alerta vermelho já foi feito há mais de ano, só que ele está em Lyon, que é a sede da Interpol. E o pessoal de lá até agora não atendeu, simplesmente se recusou a pôr e de nada adiantaram os pedidos reiterados feitos pela Interpol aqui do Brasil […] Isso já foi feito há mais de ano, nós estamos pedindo, eles não colocaram. Isso fez com que, aliás, o Allan dos Santos não fosse preso até agora […] O escritório central da Interpol, em Lyon, não coloca o nome dele no alerta vermelho, os EUA não respondem ao pedido de extradição, que já foi feito, com base até na prisão preventiva dele decretada, e a situação é essa”.

Nas mensagens seguintes, os dois juízes discutiram o fato do Governo Americano e da Interpol interpretarem o caso como uma situação política, o que foi oficializado no início deste ano, e que o “pessoal da Interpol” acreditava em mudanças no clima político após a posse do novo governo brasileiro.

— Marco Antônio Vargas (TSE) –Nem vou responder ao Ministro pq ele deve saber bem essa história”
— Airton Vieira (STF) –Sim, conhece essa história em detalhes. Não se conforma, com toda a razão. Mas nada podemos fazer quanto a essa questão da Interpol, assim como com a questão da extradição. Tudo o que podíamos fazer foi feito, seguimos todo o trâmite. Mas a Interpol em Lyon engavetou o pedido de alerta vermelho e os EUA não resolvem a questão da extradição. Difícil.”
— Marco Antônio Vargas (TSE) –“sacanagem”
— Airton Vieira (STF) –“Com certeza. Por isso esse idiota do Allan dos Santos se sente livre para fazer o que faz…”

A troca de mensagens entre os juízes auxiliares de Moraes no TSE e no STF é acompanhada de um desabafo mais de polêmico feito pelo juiz do Tribunal Superior Eleitoral brasileiro:

— Marco Antônio Vargas (TSE) –“Dá vontade de mandar uns jagunços pegar esse cara na marra e colocar num avião brasileiro”

Tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, os “jagunços” mencionados pelo juiz seriam considerados sequestradores a serviço de um Estado e o caso viraria um crime internacional de grande repercussão pública.

Nos diálogos seguintes, o braço direito de Moraes no Supremo critica a posição americana, afirmando que o país deporta sob qualquer pretexto de acordo com seus próprios interesses, e espera uma nova postura assim que o novo governo assumir no Brasil (não aconteceu).

— Airton Vieira (STF) –Se eles quiserem te mandar embora porque não gostaram dos seus olhos, eles inventam um pretexto qualquer e colocam você no primeiro avião de volta e deportam, extraditam, dão pé no traseiro, o nome que você quiser, mas eles fazem o que eles bem entenderem com quem eles quiserem. Do contrário, não há governo no mundo que determine o que eles têm que fazer […] Eles têm o tempo deles, os interesses deles, esse é o problema todo, essa é a questão […] Porque, se pra nós o Allan dos Santos tem alguma importância, pra eles a importância é zero. Então eles não vão comprar uma dor de cabeça com o governo do Brasil, em que pese o governo do Brasil ser de outra orientação. Talvez a partir de 1 de janeiro a coisa mude, não sei

À Folha de S. Paulo, o gabinete do ministro apenas disse que “todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria-Geral da República”.


A troca informal de um espião por um jornalista: De acordo com fontes do governo (“alta cúpula”), como já reportamos no ano passado, houve uma tentativa informal de trocar a extradição de Allan dos Santos com os Estados Unidos pelo espião russo Sergey Vladimirovich Cherkasov, que foi preso na Holanda com documentos brasileiros em abril de 2022 ao tentar entrar no Tribunal Penal Internacional para coletar dados sobre as investigações dos crimes de guerra cometidos pela Rússia na Ucrânia.

O espião está preso no Brasil desde então, com seu pedido de extradição para a Rússia por “ser condenado” no país por tráfico de drogas (jeito comum de repatriar espiões presos) sendo segurado pela Polícia Federal brasileira, que investiga um grande esquema de espionagem e obtenção de documentos falsos por agentes russos em solo brasileiro.

Oficialmente, Cherkasov, agente da Glavnoye Razvedyvatelnoye Upravlenie (inteligência militar russa/soviética), responde no Brasil por porte de documento falso e é investigado por espionagem, lavagem de dinheiro e corrupção passiva.

O que teria influenciado o Ministério da Justiça a não enviá-lo para os EUA, que também solicitaram sua extradição (ele também espionou em solo americano fingindo ser brasileiro), foi a “falta de reciprocidade” do governo americano em enviar o jornalista Allan dos Santos para o Brasil.

“Você sabe quando os EUA vão extraditar o Allan dos Santos? Pau que dá em Chico também dá em Francisco.” -pessoa envolvida na decisão sobre o espião russo em entrevista ao jornal local Metrópoles (não é a única fonte sobre a questão da “reciprocidade” e já abordamos este assunto anteriormente)

Nunca houve registro formal ou informal de disposição do governo americano em enviar Allan dos Santos ao Brasil*


(Matéria em atualização)

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