Juiz de São Paulo condena UBER a pagar R$ 1 bi e registrar todos os motoristas pela CLT; decisão provavelmente será reformada em breve

Motorista utilizando o aplicativo UBER | Imagem ilustrativa por Alexander Torrenegra (CC)

SÃO PAULO, 14 de setembro — O juiz Maurício Pereira Simões, da 4ª Vara do Trabalho de São Paulo, atendendo a uma ação civil pública (nº 1001379-33.2021.5.02.0004) ajuizada em 2021 por meio da Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região (unidade regional do Ministério Público do Trabalho de SP), condenou a empresa UBER a pagar uma multa de R$ 1 bilhão por danos morais coletivos e a registrar pela CLT todos os motoristas que trabalham com o aplicativo.

Essa foi a primeira sentença favorável em uma ação ajuizada contra aplicativos de transporte com relação ao reconhecimento de vínculo empregatício de motoristas ou entregadores (ações similares já foram rejeitadas pela Justiça em favor das empresas Lalamove, 99, IFood e Loggi).

“Não se trata nem sequer de negligência, imprudência ou imperícia, mas de atos planejados para serem realizados de modo a não cumprir a legislação do trabalho, a previdenciária, de saúde, de assistência, ou seja, agiu claramente com dolo, ou se omitiu em suas obrigações dolosamente, quando tinha o dever constitucional e legal de observar tais normas […] omite-se em estabelecer um mínimo de segurança financeira, de saúde, de segurança pública, de atribuição de direitos mínimos” -trecho da decisão

Para acelerar o cumprimento da decisão, o juiz ainda estabeleceu uma multa diária de R$ 10 mil para cada motorista não registrado após 6 meses do trânsito em julgado da matéria.

“A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 4ª Vara do Trabalho de São Paulo e não vai adotar nenhuma das medidas elencadas na sentença antes que todos os recursos cabíveis sejam esgotados. Há evidente insegurança jurídica, visto que apenas no caso envolvendo a Uber, a decisão tenha sido oposta ao que ocorreu em todos os julgamentos proferidos nas ações de mesmo teor propostas pelo Ministério Público do Trabalho contra plataformas, como nos casos envolvendo Ifood, 99, Loggi e Lalamove, por exemplo. A decisão representa um entendimento isolado e contrário à jurisprudência que vem sendo estabelecida pela segunda instância do próprio Tribunal Regional de São Paulo em julgamentos realizados desde 2017, além de outros Tribunais Regionais e o Tribunal Superior do Trabalho. A Uber tem convicção de que a sentença não considerou adequadamente o robusto conjunto de provas produzido no processo e tenha se baseado, especialmente, em posições doutrinárias já superadas, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal. Na sentença, o próprio magistrado menciona não haver atualmente legislação no país regulamentando o novo modelo de trabalho intermediado por plataformas. É justamente para tratar dessa lacuna legislativa que o governo federal editou o Decreto Nº 11.513, instituindo um Grupo de Trabalho ‘com a finalidade de elaborar proposta de regulamentação das atividades executadas por intermédio de plataformas tecnológicas’, incluindo definições sobre a natureza jurídica da atividade e critérios mínimos de ganhos financeiros. Jurisprudência: Nos últimos anos, as diversas instâncias da Justiça brasileira formaram jurisprudência consistente sobre a relação entre a Uber e os parceiros, apontando a ausência dos quatro requisitos legais e concomitantes para existência de vínculo empregatício (onerosidade, habitualidade, pessoalidade e subordinação). Em todo o país, já são mais de 6.100 decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho afastando o reconhecimento da relação de emprego com a plataforma. O TST já determinou em diversos julgamentos unânimes que não existe vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros. Em um dos mais recentes, a 4ª Turma do TST considerou que motoristas podem “escolher, livremente, quando oferecer seus serviço, sem nenhuma exigência de trabalho mínimo’, o que deixa claro que há ‘práticas no modelo de negócios das plataformas online que distinguem bastante os serviços realizados por meio delas das formas de trabalho regulamentadas pela CLT’. Também o STJ (Superior Tribunal de Justiça), desde 2019, vem decidindo que os motoristas “não mantêm relação hierárquica com a empresa porque seus serviços são prestados de forma eventual, sem horários pré-estabelecidos, e não recebem salário fixo, o que descaracteriza o vínculo empregatício”.Recentemente, o STF (Supremo Tribunal Federal) negou a existência de vínculo e revogou duas decisões de Minas Gerais declarando que uma delas ‘desrespeitou o entendimento do STF, firmado em diversos precedentes, que permite outros tipos de contratos distintos da estrutura tradicional da relação de emprego regida pela CLT’ e que a outra “destoa da jurisprudência do Supremo no sentido da permissão constitucional de formas alternativas à relação de emprego-nota da empresa UBER

A decisão foi elogiada pelo procurador geral do Trabalho, José de Lima Ramos, que chamou o movimento de “uma das maiores condenações em primeiro grau da história da Justiça do Trabalho brasileira”.

Por conta da jurisprudência, não é esperado que decisão seja mantida nas instâncias superiores e a empresa UBER não precisará cumprir a determinação até que se esgotem os recursos.


(Em atualização)

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