Leilão de arroz do governo tem vencedores inusitados como pequeno produtor de queijo, empresa de locação de máquinas agrícolas e fábrica de sucos

Imagem ilustrativa por Eva Bronzini

BRASÍLIA, 7 de junho — O leilão inaugural para a aquisição de arroz pelo governo federal, que foi promovido ontem (6) pela CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento) e atendeu 87,7% da expectativa de compra de 300 mil toneladas do produto, contou com a surpreendente vitória de quatro empresas que não possuem relação com o mercado do cereal, entre elas uma empresa que tem uma lojinha de queijo em Macapá, uma empresa de locação de máquinas agrícolas do DF e uma fábrica paulista de sucos.

Os lotes de arroz, que seriam comprados pelo governo no leilão por até R$ 5/kg, foram adquiridos pelos vencedores por lances de R$ 5,00, R$ 4,99 e R$ 4,98 (variação máxima de R$ 0,02, sem competição). O produto será colocado no mercado por um preço subsidiado de R$ 4 reais por quilo.

A maior vencedora, a Wisley A. de Sousa LTDA, dona de uma loja de queijo na capital do Amapá, arrematou seis lotes do leilão e terá que importar 147 mil toneladas de arroz até setembro, pagando até a próxima semana uma caução de R$ 36,8 milhões.

Imagem por Google Maps
Página do Instagram da empresa vinculada ao maior vencedor do leilão de arroz do governo (a página foi apagada após essa publicação entrar no ar)

Pela importação, a empresa, que tem um capital social de R$ 5 milhões, receberá da empresa pública CONAB R$ 736 milhões.

De acordo com a Junta Comercial do Amapá, o capital social da grande vencedora foi alterado apenas sete dias antes do leilão, passando de R$ 80 mil para R$ 5 milhões sem a entrada de novos sócios, apenas com os recursos de seu sócio único, Wisley.

A empresa de Wisley está registrada no sistema federal como uma distribuidora para comércio atacadista de leite e laticínios.

Wisley já prestou depoimento em um inquérito no Supremo que investigava irregularidades em licitações e desvio de recursos públicos atribuídos ao ex-deputado federal Roberto Góes (atual deputado estadual pelo UNIÃO e vice-presidente da CBF), quando este ocupava o cargo de prefeito de Macapá. Em 2010, o Tribunal de Contas do Amapá encontrou indícios de sobrepreço na compra de utensílios de cozinha para a Secretaria de Educação da prefeitura. A empresa de Wisley, na época chamada de Distribuidora Premium, foi contratada por R$ 352 mil para fornecer esses itens (Pregão Presencial 05/2010-SEMED/PMM). O Tribunal de Contas identificou um sobrepreço de R$ 113,6 mil. O Instituto Nacional de Criminalística (INC) da Polícia Federal reexaminou a licitação e confirmou o sobrepreço em 17 itens, totalizando R$ 172.939,85.

O caso foi arquivado no STF em maio de 2018 a pedido da então procuradora-geral da República Raquel Dodge, segundo ela, devido à falta de comprovação da ciência de Roberto Góes na fraude da licitação (todos foram liberados da acusação junto com o então prefeito).

As outras três empresas que arremataram o restante das 263 mil toneladas de arroz no leilão de ontem, em ordem de valores, foram:

  • Zafira Trading – Empresa especializada em comércio exterior de Santa Catarina que adquiriu sete lotes e se comprometeu a importar 73,8 mil toneladas de arroz ao valor de R$ 368 milhões;
  • ASR Locação de Veículos – Empresa de Brasília do ramo de locação de veículos agrícolas pesados que adquiriu dois lotes e se comprometeu a importar 22,5 mil toneladas de arroz ao valor de R$ 112,5 milhões;
  • ICEFRUIT – Empresa paulista (Tatuí) do ramo de sucos que adquiriu dois lotes e se comprometeu a importar 19,7 mil toneladas de arroz ao valor de R$ 98 milhões.

Clique aqui para ler a Ata do leilão >

De acordo com um levantamento da The AgriBiz, a ASR Locação de Veículos pertence a Crispiniano Espindola Wanderley, que já presidiu a Comissão Executiva do PROS local, já denunciou o deputado Alberto Fraga (PL-DF) por supostamente ter exigido, em um contrato de cooperativa de transportes (Coopetran/Operação Regin), uma propina de R$ 350 mil, e já ter participado, em dezembro do ano passado, de outro leilão da CONAB que comprou milho para produtores familiares da Bahia.

Em resposta a questionamentos sobre as empresas que arremataram os lotes do leilão, o diretor de Operações e Abastecimento da CONAB, Thiago dos Santos, explicou que não é possível determinar quais empresas arremataram os lotes do leilão e que também não é possível saber de onde elas importarão o arroz. No entanto, ele assegurou que o produto será distribuído em todo o país dentro de até 45 dias.

De acordo com o edital oficial, o arroz adquirido no leilão deverá ser entregue pelos fornecedores externos até 8 de setembro nos armazéns da CONAB, com vencimento para ao menos 300 dias, e deverá ser embalado ainda no país de origem em pacotes de 5 kg, já com a logomarca do governo federal. O produto será distribuído pela Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Paraná e Rio Grande do Sul.

Embalagem oficial do produto | Imagem por REPRODUÇÃO/Governo Federal
Embalagem oficial do produto | Imagem por REPRODUÇÃO/Governo Federal

Antes de ocorrer, o leilão foi alvo de oito liminares buscando impedir sua realização. A última liminar foi derrubada pelo TRF-4, a pedido da Advocacia-geral da União, pouco antes do leilão acontecer.

De acordo com as organizações agrícolas e os presidentes das principais empresas produtoras de arroz no Brasil, que criticaram a importação como desnecessária, mais de 85% da safra do grão cultivado no Rio Grande do Sul já havia sido colhida antes das intensas chuvas que atingiram o estado, responsável por cerca de 70% da produção nacional desse alimento. Mesmo sem a importação, não era esperada escassez de arroz no Brasil.


As 36,3 mil toneladas restantes das 300 mil toneladas estipuladas pelo edital que não foram adquiridas neste leilão, serão compradas em um novo leilão agendado para a próxima quinta-feira (13).


(Matéria em atualização)

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