BRASÍLIA, 12 de junho — A Polícia Federal (PF) indiciou formalmente o ministro de Estado das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil-MA, indicação política do senador Davi Alcolumbre, que deverá voltar a presidir o Senado em breve), pelos crimes de corrupção e formação de organização criminosa em uma acusação que envolve desvios de dinheiro público em obras de pavimentação financiadas pela CODEVASF (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), que é controlada pelo Centrão e gerencia verbas do “orçamento secreto”, ultimamente chamadas apenas de “emendas parlamentares”.
O ministro já havia sido alvo de uma Operação da PF em setembro do ano passado, batizada de “Operação Benesse” (desdobramento da “Operação Odoacro”, de 2021 e 2022), que chegou a afastar sua irmã Luanna Rezende, prefeita em segundo mandato de Vitorino Freire (MA).
A acusação da PF fala sobre irregularidades em obras realizadas em Vitorino Freire (MA) que foram financiadas por emendas parlamentares indicadas pelo ministro durante seu mandato como deputado federal, que beneficiavam a construtora “Construservice” (principal empresa citada no inquérito) na realização de asfaltamentos.
A “Construservice” tem como sócio oculto Eduardo Costa Barros (os sócios oficiais da empresa foram convidados por Eduardo e sequer se conheciam), conhecido localmente como “Eduardo DP” ou “Imperador”, que foi preso na primeira fase da operação original, em 2022.
De acordo com a PF, as licitações das obras eram realizadas com empresas de fachada (simulação de competição) com o propósito de fazer com que a empresa vencedora fosse sempre a de Eduardo.
Mesmo nunca tendo realizado contratos com o governo federal até 2019, de acordo com a Transparência, a empresa participou de obras de pavimentação em seis estados e recebeu cerca de R$ 400 milhões.
Ao menos R$ 42 milhões foram apontados por Juscelino Filho, como deputado, para obras de empreiteiras envolvidas no inquérito (R$ 19,3 milhões para a Construservice).
Uma parcela dos recursos investigados foi utilizada para asfaltar uma rodovia rodovia que leva à fazenda da família do ministro.
A PF já disse que encontrou diálogos entre o ministro Juscelino e Eduardo “Imperador”, que são amigos de longa data.
Segundo um relatório da PF, as mensagens mostram a “atuação criminosa de Juscelino Filho” e que “sua função na Orcrim (organização criminosa) era conhecida por todos os membros” do grupo liderado por Eduardo DP.
“Resta cristalina a relação criminosa pactuada entre Juscelino Filho e Eduardo DP” -PF
Mensagens entre Juscelino e Eduardo apuradas pela PF mostram que o próprio ministro teria uma empresa, chamada Arco Construções, que seria mantida por laranjas (ex-assessores), e que já realizou obras em Vitorino Freire financiadas por emendas enviadas por ele mesmo.
A PF também encontrou transações entre a ARCO e Eduardo DP.
Em 29 de setembro de 2022, a Codevasf já havia afastado, por determinação da Justiça Federal, o ex-gerente da 8ª Superintendência da estatal em São Luís (MA), Julimar Alves da Silva Filho, que segundo a PF teria recebido R$ 250 mil da construtora Construservice.
De acordo com dados da transparência, obtidos pelo O Estado de S. Paulo no ano passado, desde 2015, quando Juscelino assumiu seu primeiro mandato como deputado federal, ao menos quatro empresas de amigos, ex-assessoras e uma cunhada do ministro foram beneficiadas com contratos com a prefeitura de Vitorino Freire que somados ultrapassam a cifra de R$ 36 milhões.
O indiciamento será relatado por Flávio Dino (herdado da ministra Rosa Weber), que poderá (já sinalizou que fará isso) se declarar impedido nas investigações que envolvem seu ex-colega de Esplanada.
Essa não foi a primeira polêmica criada pelo ministro no governo. No início do ano passado, Juscelino Filho usou um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) e recebeu quatro diárias e meia no mesmo fim de semana em que participou de leilões de cavalos de raça.
A viagem foi solicitada com status de urgência para o cumprimento de compromissos oficiais.
De acordo com a agenda do ministro, os eventos que contavam com a presença dele totalizavam apenas duas horas e meia.
Oa advogados do Juscelino Filho chegaram a dizer que ele ‘pegou uma carona’ no voo de volta com o ministro do Trabalho Luiz Marinho e que isso não teria custado dinheiro público extra, porém os documentos do ministério da Defesa mostraram que isso não era a realidade e que um voo foi solicitado pelo próprio ministro.
Dados obtidos via Lei de Acesso à Informação também mostraram que Juscelino não constava na relação de passageiros do voo de Luiz Marinho.
Os voos pela FAB de ida e volta do ministro custaram aos cofres públicos R$ 130.392,87.
Nota divulgada pela defesa do ministro:
“A investigação, que deveria ser um instrumento para descobrir a verdade, parece ter se desviado de seu propósito original. Em vez disso, concentrou-se em criar uma narrativa de culpabilidade perante a opinião pública, com vazamentos seletivos, sem considerar os fatos objetivos. O indiciamento é uma ação política e previsível, que parte de uma apuração que distorceu premissas, ignorou fatos e sequer ouviu a defesa sobre o escopo do inquérito. É importante deixar claro que não há nada, absolutamente nada, que envolve minha atuação no Ministério das Comunicações, pautada sempre pela transparência, pela ética e defesa do interesse público. Trata-se de um inquérito que devassou a minha vida e dos meus familiares, sem encontrar nada. A investigação revira fatos antigos e que sequer são de minha responsabilidade enquanto parlamentar. No exercício do cargo como deputado federal, apenas indiquei emendas parlamentares para custear obras. A licitação, realização e fiscalização dessas obras são de responsabilidade do Poder Executivo e dos demais órgãos competentes. Durante o meu depoimento, o delegado responsável não fez questionamentos relevantes sobre o objeto da investigação. Além disso, o encerrou abruptamente após apenas 15 minutos, sem dar espaço para esclarecimentos ou aprofundamento. Isso suscita dúvidas sobre sua isenção, repetindo um modo operante que já vimos na Operação Lava-Jata e que causou danos irreparáveis a pessoas inocentes. É importante lembrar que o indiciamento não implica em culpa. A Justiça é a única instância competente para julgar, e confio plenamente na imparcialidade do Poder Judiciário. Minha inocência será comprovada ao final desse processo, e espero que o amplo direito de defesa e a presunção de inocência sejam respeitados.”
(Matéria em atualização)