BRASÍLIA, 1 de junho — A Polícia Federal está nesta manhã realizando uma operação que recebeu o nome de “Hefesto” e que teria por objetivo desarticular uma organização criminosa suspeita de praticar crimes de fraude em licitação e lavagem de dinheiro com a utilização do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) para o fornecimento de equipamentos de robótica para 43 municípios do estado do Alagoas; os alvos são aliados do presidente da Câmara Arthur Lira e do ex-ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.
A Operação, que acontece um dia após o duro atrito entre o presidente Lula e o presidente da Câmara para a aprovação da MP que reorganizava os ministérios desta gestão do Executivo, envolve 110 policiais federais e 13 servidores da CGU local (Controladoria Regional da União em Alagoas).
Os agentes estão cumprindo, por determinação da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Alagoas, 27 mandados de busca e apreensão, sendo 16 no próprio estado do Alagoas (em Maceió), 8 no DF, 1 em Pernambuco (em Gravatá), 1 em São Paulo (em São Carlos) e 1 em Goiás (em Goiânia), além de 2 mandados de prisão temporária no DF.
Um dos alvos da operação de hoje (busca e apreensão) é um ex-assessor do próprio presidente da Câmara, Arthur Lira.
O ex-assessor de Lira, Luciano Ferreira Cavalcante, visto com um braço direito do presidente da Câmara, ainda está lotado na liderança do partido Progressistas (contratado em 2017 quando Arthur Lira era o líder da bancada do partido).
Em 2011, o ex-assessor havia sido contratado para atuar em um escritório de representação do pai de Arthur Lira, o então senador Benedito de Lira.
A decisão também fala no sequestro de bens móveis e imóveis dos investigados, no valor de R$ 8,1 milhões e a suspensão de todos os processos licitatórios e contratos administrativos celebrados entre a única empresa fornecedora investigada e os municípios do estado que receberam recursos do FNDE para aquisições dos equipamentos.
Ainda de acordo com a PF, foram realizadas, pelos sócios da única empresa fornecedora e pelos outros investigados, movimentações financeiras para “pessoas físicas e jurídicas sem capacidade econômica e sem pertinência com o ramo de atividade de fornecimento de equipamentos de robótica”, o que, segundo a PF, poderia indicar a ocultação de bens, direitos e valores provenientes dos crimes.
Algumas das transações citadas teriam sido fracionadas em quantias individuais abaixo de R$ 50 mil, com o aparente fim de burlar o sistema de controle do COAF.
Logo em seguida, eram realizados saques em espécie e entregas dos numerários aos destinatários.
Do total de recursos para a aquisição de kits de robótica que foram distribuídos no Brasil neste período, 67,6% foram destinados ao estado do Alagoas, que foi acompanhado pelo Pernambuco, que ficou com 13%, Amazonas com 4,7%, Rio com 3,7%, Mato Grosso do Sul com 3,5%, São Paulo com 2%, Tocantins com 1,3%, Amapá com 1,2%, Piauí com 1,1%, Bahia com 0,7%, Paraná com 0,3%, Maranhão com 0,3%, Santa Catarina com 0,2%, Sergipe com 0,1%, Goiás com 0,1%, e assim por diante.
Nos anos citados pela PF, o fundo era presidido por Marcelo Lopes da Ponte, ex-chefe de gabinete do ex-ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira.
“O que posso dizer é que eu, tendo a postura que tenho, em defesa das emendas parlamentares que levam benefício para todo o Brasil, eu não tenho absolutamente nada a ver com o que está acontecendo e não me sinto atingido, nem acho que isso seja provocativo […] As coisas são levadas pela polarização política. Eu não vou comer essa corda, eu vou me ater a receber informações mais precisas. Cada um é responsável pelo seu CPF nesta terra e neste país” –Arthur Lira, comentando sobre o caso à emissora local GloboNews
Ambos, Arthur Lira e Ciro Nogueira participaram juntos nesta manhã de um evento em BH para a posse da nova diretoria estadual do partido Progressistas.
Ainda ontem, durante a reunião do Plenário da Câmara que votou a MP de restruturação dos ministérios do atual governo, o ministro Dias Toffoli, do STF, desengavetou uma ação (denúncia da ex-PGR Raquel Dodge) na qual Arthur Lira é acusado de corrupção, após um ex-assessor ter sido flagrado transportando R$ 106,4 mil em espécie.
Jaymerson Gomes de Amorim havia sido detido com o dinheiro em fevereiro de 2012, quando tentava embarcar em um voo no Aeroporto de Congonhas transportando a quantia “nas roupas e junto ao corpo”.
Segundo a denúncia, a passagem aérea de Jaymerson havia sido comprada com o cartão de crédito de Lira e, de acordo com a investigação, os dois “trocaram mensagens e telefonemas no dia do episódio”.
Ainda segundo a denúncia, o dinheiro transportado pelo assessor consistia em um pagamento feito a Arthur Lira por Francisco Colombo (faleceu em 2014), então presidente da estatal CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos), para se manter no cargo.
A peça estabelece o vínculo entre os dois com base em depoimentos e delações de Alberto Yousseff e com base em “chamadas frequentes entre o atual presidente da Câmara e o então dirigente da CBTU na época da apreensão da quantia.
A denúncia contra Arthur Lira já havia sido aceita pelos ministros, mas a defesa apresentou um recurso (embargos declaratórios) contra a medida.
Formou-se uma maioria em 2020 para a rejeição deste recurso, mas Dias Toffoli, resolveu fazer um pedido de vistas antes do encerramento dessa fase.
Dias Toffoli havia pedido mais tempo para analisar os autos em novembro de 2020 e a questão estava engavetada até ontem.
Ambos, Arthur Lira e Ciro Nogueira, eram nomes do conhecido escândalo do “Quadrilhão do PP” (“organização criminosa”). A denúncia contra os dois parlamentares havia sido aceita pela 2ª Turma do STF em 2019, e posteriormente rejeitada, depois de um recurso, pela mesma 2ª Turma do STF em março de 2021 após a entrada do ministro Nunes Marques.
(Em atualização)