SÃO PAULO, 21 de maio — O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, acatou hoje um pedido da defesa de Marcelo Odebrecht, que argumentou que, como Toffoli havia considerado “imprestáveis” os atos da Lava Jato para anular alguns famosos acordos de leniência (utilização de mensagens hackeadas na chamada “vaza jato”), o mesmo deveria valer para os casos que envolvem ex-presidente da companhia que levava seu sobrenome e hoje se chama NOVONOR.
Na decisão de hoje, Toffoli disse que os membros da Força Tarefa da Lava Jato trabalhando juntos e ignoraram princípios essenciais do processo justo, contraditório, e ampla defesa visando interesses pessoais “corroendo-se as bases do processo penal democrático”.
“Diante do conteúdo dos frequentes diálogos entre magistrado e procurador especificamente sobre o requerente, bem como sobre as empresas que ele presidia, fica clara a mistura da função de acusação com a de julgar, corroendo-se as bases do processo penal democrático […] Em face do exposto, defiro o pedido constante desta petição e declaro a nulidade absoluta de todos os atos praticados em desfavor do requerente no âmbito dos procedimentos vinculados à Operação Lava Jato, pelos integrantes da referida operação e pelo ex-juiz Sérgio Moro no desempenho de suas atividades perante o Juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba, ainda que na fase pré-processual, determinando, em
consequência, o trancamento das persecuções penais instauradas em desfavor do requerente no que atine à mencionada operação” -Dias Toffoli
Apesar de Dias Toffoli também ter determinado o trancamento de TODOS os procedimentos penais instaurados contra Marcelo Odebrecht, o ministro disse seguem válidos os acordos de delação premiada que foram assinados por ele com a Lava Jato.
Marcelo havia sido condenado inicialmente na Lava Jato, em 2016, a 19 anos e 4 meses de prisão, pena que foi reduzida para 10 anos por conta de acordos com a Justiça, e que foi novamente reduzida em 2022 pelo Supremo Tribunal Federal para 7 anos (já cumpridos).
No momento de sua prisão, Marcelo aparecia em 9º lugar na lista dos brasileiros mais ricos da Forbes*
Em dezembro 2017, Marcelo deixou a prisão e passou a cumprir pena domiciliar.
Em 2019, Marcelo Odebrecht obteve progressão de regime e autorização para voltar a trabalhar.
Em 2021, através de um programa criado em 2019 pela Central de Penas e Medidas Alternativas da Justiça Federal de SP (Cepema) com o Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, Marcelo começou a trabalhar no Hospital das Clínicas de São Paulo.
De acordo com os documentos, Marcelo Odebrecht trabalhou no hospital até 26 de janeiro de 2023 e concluiu a sua pena por corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Acordo de Leniência da Odebrecht: Corrigindo pela taxa selic, o valor acertado entre a Lava Jato e a Odebrecht no acordo de leniência que teve o pagamento suspenso em fevereiro deste ano também por decisão de Toffoli, chegaria a cerca de R$8,5 bilhões nos 23 anos de pagamentos.
Este acordo de leniência havia sido fechado com a Lava Jato em dezembro de 2016 após a construtora confessar corrupção em 49 contratos de obras públicas entre os anos de 2006 e 2014.
Ao todo, 77 executivos da construtora confessaram crimes em acordos homologados pelo Supremo.
Para defender a suspensão do acordo, Toffoli seguiu a mesma linha de sua decisão favorável à J&F, que utilizou as mensagens da chamada “vaza jato”, que foram copiadas ilegalmente, para dizer que havia “no mínimo uma dúvida razoável” na “voluntariedade dos acordos” com o grupo, indicando que a Lava Jato se utilizou de meios que levassem as empresas ao caminho das delações e acordos.
Na época dos escândalos da empresa, uma famosa lista de apelidos, atribuídos por diretores da própria Odebrecht, viralizou no Brasil com nomes que seriam dados a políticos e agentes do Estado. Os nomes estavam em planilhas e emails da companhia.
Um nome que circulou na época, foi o do próprio ministro Dias Toffoli, que foi chamado em um email interno de Marcelo Odebrecht de “amigo do amigo de meu pai”, em referência ao pai de Marcelo, Emílio Odebrecht.
O apelido atribuído por Marcelo ao ministro gerou um dos episódios mais graves da democracia moderna brasileira, quando Toffoli determinou, em um ordem assinada por l Alexandre de Moraes, a retirada da matéria da Revista Crusoé que falava sobre o assunto. A decisão de Toffoli ainda incluía uma convocação para que os jornalistas, que citaram um email real e uma delação real que estavam nos autos da Lava Jato, prestassem depoimentos na Polícia Federal em 72 horas, além multa diária de R$ 100 mil para um eventual descumprimento da ordem judicial.
Na ordem, Moraes disse que Toffoli “autorizou” a investigação e que o conteúdo da reportagem seria “mentiras” e “fake news” como o fim de atingir as “instituições brasileiras”.
Por conta da enorme repercussão negativa pela censura à Crusoé, censura essa que recebeu críticas até de outros ministros do Supremo, Moraes revogou a medida argumentando que ficou comprovado que realmente existia o documento citado pela reportagem.
A empresa, que foi implicada em casos de corrupção em dezenas de países e causou a prisão de vários presidentes e políticos pelo mundo (um ex-presidente peruano chegou a se matar para não ir preso), foi chamada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos como a responsável pelo “maior caso de corrupção global da história”.
Entre os países que implicaram a empresa em escândalos de corrupção estão o Brasil, Estados Unidos, Suíça, República Dominicana, Panamá, Equador, Peru, Guatemala, Guiné Equatorial, Gana, Moçambique, Colômbia, Argentina, Portugal, México e Angola.
(Matéria em atualização)