BRASÍLIA, 18 de maio — A ONG Transparência Internacional emitiu na noite de ontem uma nota criticando a decisão do Tribunal Superior Eleitoral que cassou o mandato do (ainda) deputado federal e ex-procurador da Lava Jato Deltan Dallagnol; entidade havia se posicionado publicamente contra o ex-procurador Dallagnol e também contra o ex-juiz e agora senador Sergio Moro quando os dois divulgaram apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro na eleição de 2022.
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De acordo com a Transparência Internacional, “a alteração casuística do entendimento jurisprudencial amplia os riscos de utilização abusiva da Lei da Ficha Limpa, enfraquecendo um instrumento fundamental de enfrentamento da corrupção política e prejudicando a representação democrática. Por se tratar de agente público que atuou em casos de macrocorrupção envolvendo indivíduos do mais alto poder, a atipicidade da decisão também amplia a insegurança jurídica e o chamado ‘chilling effect’ a agentes da lei atuando contra interesses poderosos”.
“Ampliar hipótese de inelegibilidade, prescindindo do requisito literal e objetivo da lei sobre existência de procedimento administrativo disciplinar (PAD), ameaça direitos políticos fundamentais, resguardados pela Constituição e tratados internacionais. Este precedente acarreta perigo sistêmico, uma vez que a interpretação extensiva do TSE poderá logo ser aplicada a outros casos por juízes eleitorais em todo o Brasil, inclusive para outras hipóteses de inelegibilidade previstas na Lei da Ficha Limpa […] A unanimidade, nesse caso, não é sinônimo de ausência de controvérsia jurídica sobre o caso. Nestes termos, a revogação de mandato de membro do Congresso Nacional produz impacto adicional sobre a confiança da sociedade no processo eleitoral. Em um contexto de impunidade sistêmica da corrupção política, esta desconfiança se amplia sobre a Justiça — já seriamente atacada” –trecho da nota pública emitida pela ONG
O ex-procurador Deltan Dallagnol foi cassado por unanimidade pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral na última terça-feira (16) em uma votação que, após a longa leitura do voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, durou menos de 2 minutos.
De acordo com Benedito Gonçalves, Dallagnol fraudou a Lei da Ficha Limpa ao pedir exoneração do cargo enquanto era alvo de cerca de 15 sindicâncias internas do Ministério Público (procedimento preliminar antes da instalação de um Processo Administrativo Disciplinar/PAD).
De acordo com a Lei da Ficha Limpa, o ex-procurador da Lava Jato deveria estar respondendo a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) para ter sua candidatura barrada, porém o relator do caso inaugurou uma interpretação de que Dallagnol teria deixado seu cargo de propósito para evitar que as sindicâncias internas virassem processos administrativos, e que essa intenção feria diretamente a lei.
A ação (movida pelos partidos PT, PCdoB, PV e PMN) chegou ao TSE através um recurso, pois havia sido rejeitada por unanimidade pelo TRE (instância inferior) em outubro de 2022 no deferimento da candidatura de Dallagnol.
Também fazia parte da ação a condenação do ex-procurador pelo TCU por gastos com diárias e passagens na operação Lava Jato, mesmo com o Ministério Público Eleitoral (MPE) opinando pela regularidade da candidatura do deputado.
De acordo com o relator, a questão da condenação do TCU sobre as irregularidades nas diárias e passagens de integrantes da força-tarefa da Lava Jato não incidiu inelegibilidade pois a decisão foi suspensa pela Justiça.
Com 344.917 votos, Deltan Dallagnol foi o deputado federal eleito com mais votos no estado do Paraná nas eleições de 2022.
Apesar da Câmara ainda não ter formalizado a saída do deputado, que ainda luta internamente para conseguir apoio e reverter o cumprimento da decisão por parte da Casa legislativa, o sistema do Tribunal Superior Eleitoral já mostra Deltan Dallagnol como “não eleito” (“candidatura indeferida”).
Como a Corregedoria da Câmara já encaminhou ao deputado a notificação do processo de cassação, o deputado terá 5 dias para se defender (procedimento).
Interlocutores da Câmara dão como certa a rejeição da articulação política para salvar o mandato do ex-procurador da Lava Jato.
De acordo com os dados do TRE, que realizou uma nova contagem de votos (procedimento que dá andamento no caso) para saber que assumirá o posto de Dallagnol, sua cadeira será ocupada pelo Pastor Itamar Paim (PL), de 46 anos, natural de Paranaguá.
Paim é Pastor na 59ª Igreja do Evangelho Quadrangular, em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba e recebeu 47.052 votos nas eleições de 2022.
O primeiro suplente natural de Dallagnol seria o ex-deputado (7 mandatos entre os anos de 1991 e 2019) Luiz Carlos Hauly, porém ele não assumirá a cadeira por não ter conquistado o mínimo de votos necessários segundo critérios da legislação eleitoral (teve pouco mais de 11 mil votos).
Recurso no Supremo: Deltan Dallagnol já anunciou publicamente que recorrerá da decisão do Tribunal Superior Eleitoral que cassou o seu mandato no Supremo Tribunal Federal.
Na contagem informal, o deputado já sai com 4 votos contrários dos 10 ministros que hoje ocupam a Corte suprema do país.
Participaram da votação que cassou por unanimidade o mandato do deputado no TSE os ministros do Supremo Cármen Lúcia, Kassio Nunes Marques (ocupou a cadeira do ex-ministro Ricardo Lewandowski) e Alexandre de Moraes.
O ministro Gilmar Mendes já falou em entrevistas sobre o assunto e se posicionou contrário à liberação da candidatura de Deltan Dallagnol.
(Em atualização)