Argentina, Uruguai e Equador condenam oficialmente a inelegibilidade da principal opositora de Nicolás Maduro

Opositora venezuelana Maria Corina Machado | Imagem por Carlos Díaz (CC)

CARACAS, 28 de janeiro — Os governos da Argentina, Uruguai e Equador criticaram, de forma oficial, a impugnação da candidatura da principal opositora do ditador venezuelano Nicolás Maduro que foi oficializada ontem pelo “Tribunal Supremo de Venezuela”, equivalente ao nosso Supremo Tribunal Federal; Maria Corina Machado viu ontem sua candidatura como vencedora das primárias da oposição (venceu com mais de 90% dos votos) ser derrubada oficialmente por uma contestada pena de inelegibilidade que havia sido extinta em 2016 e que foi estendida por mais 15 anos, contando a partir de julho do ano passado.

Em nota divulgada pelo presidente uruguaio Lacalle Pou, o mandatário diz que a Venezuela não cumpriu os acordos internacionais firmados com a oposição e que “observa com grande preocupação essas desqualificações judiciais de opositores políticos para ocupar cargos eletivos ou públicos”.

“Contrariando os Acordos de Barbados assinados em outubro passado com garantidores internacionais, o governo da República Bolivariana da Venezuela e representantes da oposição política em torno da Plataforma Unitária, confirmou a desqualificação da senhora María Corina Machado, entre outros, líder principal da oposição e aspirante a participar nas próximas eleições presidenciais desse país, previstas para este ano. O Uruguai observa com grande preocupação essas desqualificações judiciais de opositores políticos para ocupar cargos eletivos ou públicos […] [essas medidas] atentam diretamente contra a realização de eleições livres, democráticas e competitivas.” –Presidente uruguaio Luis Lacalle Pou

No mesmo caminho do presidente uruguaio, a Argentina de Javier Milei, através de uma nota de seu ministério das Relações Exteriores, disse que “acompanha com preocupação com a situação política na Venezuela” e que espera que as eleições contem com a participação da oposição e de “observadores eleitorais externos”.

“A Argentina acompanha com preocupação a situação política na Venezuela e lamenta a decisão de desqualificar para o exercício de funções públicas a principal líder da oposição e vencedora das primárias, María Corina Machado. A Argentina reafirma seu compromisso na defesa da liberdade, democracia e direitos humanos, e espera a rápida realização de eleições presidenciais democráticas, transparentes, com plena participação de todos os candidatos políticos e presença de observadores eleitorais externos.” -trecho da nota emitida pela Chancelaria argentina

Há pouco, por meio das contas oficiais do governo equatoriano em redes sociais, o Equador também se posicionou contrário à inabilitação da candidata venezuelana.

“O Equador rejeita a confirmação do Tribunal Supremo da Venezuela de desqualificar, por 15 anos, para exercer funções públicas, a senhora María Corina Machado, líder da oposição e vencedora das eleições primárias de outubro de 2023. Esta decisão é contrária ao espírito do acordos de Barbados, destinado a facilitar a realização de eleições democráticas e transparentes na Venezuela” -nota do governo equatoriano

É esperado que o governo paraguaio, do novo presidente Santiago Peña, também se posicione contrário ao movimento do regime venezuelano através de seu ministério das Relações Exteriores.

Presidente paraguaio Santiago Peña falando sobre o tema em novembro de 2023; “Nós questionamos a inabilitação por parte da autoridade eleitoral da Venezuela. Seguiremos lutando sobre isso. O Paraguai tem uma responsabilidade moral com a democracia”

Por ora, estes foram os únicos países da região que comentaram sobre o assunto desde a decisão do Supremo venezuelano.


A DECISÃO: O “Tribunal Supremo de Venezuela”, equivalente ao nosso Supremo Tribunal Federal, confirmou ontem a inelegibilidade da candidata presidencial venezuelana Maria Corina Machado, vencedora das primárias da oposição local (recebeu mais de 90% dos votos), que deve -ou deveria- enfrentar ainda neste ano o ditador Nicolás Maduro em eleições gerais.

A decisão do Supremo venezuelano ratificou uma outra decisão da Controladoria-Geral da República da Venezuela de julho do ano passado, que atendendo a um pedido do deputado aliado do regime José Britoestendeu uma antiga e já extinta punição aplicada contra a candidata.

Corina, uma “católica ferrenha”, é conhecida localmente como “dama de ferro” e sempre representou a ala mais contrária aos chavistas, rejeitando qualquer tipo de acordo e sendo opositora e crítica até do governo paralelo de Juan Guaidó.

No 𝕏 (Twitter), a candidata acusou o regime venezuelano de “acabar com o Acordo de Barbados”, um acordo fechado em 2023 na Noruega que -apenas- em teoria traçava um plano para rever inelegibilidades e criava garantias de eleições democráticas no país.

Corina Machado, pedindo que ninguém duvide, também disse que “Maduro e o seu sistema criminoso escolheram o pior caminho para eles: eleições fraudulentas. Isso não vai acontecer.”


HISTÓRICO DA DECISÃO: Em fevereiro de 2014, Corina foi uma das maiores líderes das grandes manifestações contrárias ao regime venezuelano que foram registradas no país.

Seu mandato na Assembleia Nacionalvenezuelana, que na época era comandada por Diosdado Cabello, um dos maiores narcotraficantes da América do Sul, hoje um dos ‘braços direitos’ de Maduro e líder da milícia armada do regime, os “Colectivos”, foi cassado cerca de um mês depois.

Em 2015, com o argumento de que Corina não havia declarado patrimônios que havia recebido (o que foi negado por ela), a Controladoria-Geral venezuelana condenou a opositora a não exercer cargos públicos por 12 meses e a proibiu de deixar o país.

Post da TV estatal venezuelana anunciando a punição por “12 meses” (post de 2015)

Em teoria, Corina já estava liberada para concorrer às eleições venezuelanas, porém a Corregedoria-Geral local decidiu em julho do ano passado, após um pedido de revisão de um deputado aliado do regime, que por ela ter apoiado as sanções dos Estados Unidos contra o ditador Maduro, a punição receberia uma “extensão” de 15 anos, contando da data da decisão.

Desde então, Corina aguardava um recurso no Supremo venezuelano, que poderia reformar a decisão por conta de um acordo entre oposição e regime que foi firmado na Noruega (acordo não cumprido).


Controversa posição pública brasileira: Em março do ano passado, ao retornar ao Brasil após uma visita com direito a encontro com o ditador Nicolás Maduro, o assessor especial da Presidência Celso Amorim, que cumpre a função de chanceler informal do governo, mesmo com os claros sinais de que Maduronão respeitaria qualquer tipo de eleições limpas na Venezuela, disse em entrevistas que “em 20 anos” de relações com o país, ele nunca havia visto “um clima tão grande deincentivo à democracia”.

Em maio e junho do mesmo ano vieram mais duas falas polêmicas sobre a Venezuela que partiram do próprio presidente Lula.

Em maio, o mandatário brasileiro criou polêmica ao dizer, ao lado de Maduro, que o autoritarismo e a “antidemocracia” venezuelana são uma narrativa; “nossos adversários vão ter que pedir desculpa”.

Em junho, em uma entrevista concedida pelo presidente Lula à Rádio Gaúcha, o presidente disse que o “conceito de democracia é relativo” e que “quem quiser derrotar o Maduro, derrote nas próximas eleições e assuma o poder”, dando ar de legitimidade ao processo eleitoral venezuelano que é contestado até pela ONU.

Ambas as falas foram seguidas de uma série de reparações e ajustes pela equipe próxima do presidente, que passou semanas modulando o discurso que deveria ser utilizado em declarações públicas.


(Matéria em atualização)

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