BRASÍLIA, 21 de maio — Alegando que a retroatividade da lei poderia “macular o princípio da segurança jurídica”, a área técnica do Tribunal de Contas da União (TCU) disse que o presidente Lula poderá ficar com um relógio de luxo que lhe foi dado de presidente durante o seu primeiro mandato, um Cartier Santos Dumont.
A resposta da Corte surgiu de uma representação ao TCU feita pelo deputado federal Ubiratan Sanderson (PL-RS), que no ano passado questionou à Corte se Lula poderia manter um outro relógio de luxo, da marca Piaget (avaliado em R$ 80 mil), que Lula havia recebido como presente do ex-presidente francês Jacques Chirac.
Em uma live no ano passado, Lula disse que havia perdido esse relógio e que passou a usá-lo depois de encontrá-lo em uma gaveta.
“Você sabe que esse relógio ficou perdido 25 anos? Eu não sabia onde estava. Agora, que eu fui mudar, fui abrir a gaveta, e ele estava lá” -Lula
Sobre o relógio citado na representação (Piaget), o TCU afirmou que não poderia analisar a questão, pois a peça não constava na lista de presentes oficiais recebidos por Lula, não cabendo à área técnica avaliá-lo.
“Ante a descaracterização do relógio apontado na inicial da representação como presente dado ao Exmo. Sr. Luiz Inácio Lula da Silva, no exercício de mandato de Presidente da República Federativa do Brasil, e, principalmente, por essa condição, bem como ante a ausência de quaisquer outros elementos que indiquem que o referido objeto é bem público da União, é forçoso reconhecer-se a improcedência da representação” -TCU (parecer obtido pelo jornal O Estado de SP)
Quanto ao Cartier Santos Dumont (feito em ouro branco 18 quilates e prata 750, com uma coroa feita de safira azul), o TCU confirmou que o presente foi dado a Lula em julho de 2005 pela própria empresa Cartier. Apesar de o tribunal reconhecer que presentes de alto valor deveriam ser devolvidos à União, como essa determinação passou a vigorar apenas em 2023, e para não “macular o princípio da segurança jurídica”, o TCU decidiu que não seria recomendada a devolução da peça de luxo.
“A aplicação retroativa do entendimento retromencionado poderia (em tese) macular o princípio da segurança jurídica” -TCU
Este relógio já havia aparecido em 2016 na lista de mais de 400 itens que Lula teve que devolver por uma decisão do mesmo Tribunal.
Na época, Lula devolveu 453 presentes à União, mas manteve alguns itens, como um relógio Cartier, alegando que estes tinham um “caráter personalíssimo”. O TCU não contestou essa alegação.
Na lista oficial de itens que foram mantidos por Lula ainda estão um relógio suíço com a imagem do já morto ex-ditador da Líbia, Muammar Kadafi, e um colar de ouro branco da empresa de investimento estatal da China Citic Group Corporation (estes itens não foram objeto de análise do TCU).
É esperado que este mesmo parecer do TCU seja utilizado nos processos ainda não analisados do ex-presidente Jair Bolsonaro, também sobre itens recebidos como presente e citando as mesmas normas, para condená-lo por crimes de peculato e lavagem de dinheiro (investigação sendo realizada pela Polícia Federal).
(Matéria em atualização)