BRASÍLIA, 13 de março — Por maioria de 3 votos a 2, a 5ª turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que, em alguns casos, é possível não ser considerado estupro de vulnerável o relacionamento sexual entre uma menina de 12 anos de idade e um homem de 20 anos; sob a lei brasileira, no Código Penal, artigo 217-A, toda e qualquer relação sexual com menores de 14 anos é considerado como crime de estupro de vulnerável, mesmo com uma alegação de consentimento da vítima, que sequer é considerado antes dessa idade, ou de um eventual passado sexual (Súmula 593 do próprio STJ).
No caso concreto (AREsp 2389611), o tribunal julgava o caso de um homem de 20 anos que começou a buscar uma menina de apenas 12 anos da porta de uma escola, a se relacionar sexualmente com ela, fazendo-a abandonar suas aulas, e por fim a engravidando.
O processo chegou ao STJ após o réu ter sido condenado em 1º grau pela prática de estupro de vulnerável com uma pena de 11 anos e 3 meses de prisão, e ter sido absolvido pelo TJ-MG com a alegação de que ele não sabia que estava cometendo um crime (“erro de proibição”).
Reynaldo Soares da Fonseca, o ministro relator do caso no STJ, votou por afastar o crime de estupro de vulnerável indicando que a punição afetaria a prioridade absoluta da criança sendo gestada e poderia causar mais danos à criança grávida; “Estamos aqui aplicando a jurisprudência, cuja exceção confirma a regra”.
O relator foi acompanhado pelos ministros Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik, que concordaram que o réu poderia não ter conhecimento de que estaria cometendo um crime.
Ficaram vencidos os ministros Daniela Teixeira e Messod Azulay, que fizeram duríssimos votos contrários ao réu.
“Não se pode, racionalmente, aceitar que um homem de 20 anos de idade não tivesse a consciência da ilicitude de manter relação sexual com uma menina de 12 anos. Não se trata, o agressor, do ‘matuto’ exemplificado nas doutrinas de Direito Penal, ou do ermitão que vive totalmente isolado da sociedade, sem qualquer acesso aos meios de comunicação ou à sociedade. Ademais, aceitar a incidência de tal excludente de tipicidade sem comprovação inequívoca de seus requisitos, em especial em crimes de natureza sexual contra crianças e adolescentes, pode resultar na definição da responsabilidade penal do ato a partir de uma avaliação subjetiva do agente sobre o corpo da vítima, o que é inadmissível dentro da doutrina constitucional da proteção integral […] O que vai acontecer é que os coronéis desse país vão misteriosamente se apaixonar pelas meninas de 12 anos. Essa será a principal excludente de ilicitude em todos os casos de estupro de vulnerável […] É pouco crível que o acusado não tivesse ciência da ilicitude da sua conduta.” -ministra Daniela Teixeira
Messod Azulay chegou a citar a insegurança jurídica causada pela maioria que havia se formado no julgamento, lembrando da tese vinculante consolidada pela Súmula 593 do próprio STJ que classifica a presunção do caso como absoluta.
“Cada um tem uma cabeça. Cada um julga de acordo com o seu conceito, com a criação que vem da sua casa, com a sociedade com que convive, e no final das contas cada um tem uma compreensão sobre os fatos. Na minha visão não é assim e para isso existe a lei, para isso existe a Constituição, e isso é o que traz na verdade a segurança. Se a lei diz que a presunção é absoluta quando se comete violência sexual contra uma menor de 14 anos, é porque ela é absoluta” –ministro Messod Azulay
De acordo com a legislação atual, a pena mínima para o réu, que teve sua absolvição mantida pelo STJ, deveria ser de ao menos oito anos de prisão.
(Matéria em atualização)