Ministro relator da decisão que cassou o mandato de Deltan Dallagnol já foi alvo de delação na Lava Jato; ministro “mantinha estreita relação com o empreiteiro Léo Pinheiro”

Ministro Benedito Gonçalves | Imagem por Superior Tribunal de Justiça (oficial)

BRASÍLIA, 19 de maio — O ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que foi muito citado nos últimos dias por ter relatado o voto – acompanhado por todos os outros ministros – que cassou o mandato do deputado e ex-procurador da Lava Jato Deltan Dallagnol, já foi matéria da Revista Veja por aparecer nos contatos e mensagens no aparelho celular do empreiteiro José Aldemário Pinheiro, mais conhecido como Léo Pinheiro (OAS), e por ter sido alvo de delação (não necessariamente implica em um crime) na própria Lava Jato; revista fala que o “Ministro Benedito Gonçalves mantinha estreita relação com o empreiteiro Léo Pinheiro, sócio da construtora OAS, investigado na Lava Jato”.

O tema também foi abordado pela Folha em uma reportagem 01 de maio de 2017 sobre a empreiteira OAS pretender delatar dois ministros do STJ (o outro citado na reportagem seria o ministro Humberto Martins), pelo portal O Antagonista em 19 de agosto de 2016, e pelo portal Brasil247 em 28 de junho de 2018.

Benedito Gonçalves, 69 anos, chegou a ser o mais cotado para assumir a cadeira deixada pelo ex-ministro Joaquim Barbosa, que posteriormente acabou sendo ocupada pelo ministro Edson Fachin, e hoje é um dos principais concorrentes do advogado Cristiano Zanin à cadeira deixada pelo ministro Ricardo Lewandowski*

Gonçalves entrou no STJ por uma indicação do presidente Lula no dia 01 de agosto de 2008, foi nomeado no dia 27, e tomou posse no dia 17 de setembro do mesmo ano*

Benedito chegou a ser alvo de um procedimento de investigação, que foi posteriormente arquivado pela então Procuradora-Geral da República Raquel Dodge por “extinção da punibilidade e prescrição”, e alvo, em 2015, de um pedido de providências no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), pedido que foi arquivado já em 2016.

De acordo com Léo Pinheiro (OAS), os dois teriam se conhecido no ano de 2013, em reuniões que teriam acontecido para discutir processos envolvendo a empreiteira no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Segundo o empreiteiro, que é citado até em casos de corrupção envolvendo ex-presidentes do Peru, até o início de 2014, o ministro Benedito Gonçalves teria julgado duas causas de maneira favorável à empreiteira.

Léo Pinheiro disse que recebeu pedidos do ministro para que ele o apoiasse em seu objetivo de ser indicado ao Supremo Tribunal Federal; “Na época, o ministro buscava angariar apoio no meio empresarial para a sua candidatura ao STF e, durante os nossos encontros, trocamos algumas impressões sobre os caminhos que ele deveria seguir na sua candidatura” (trecho de um relado do empreiteiro).

Segundo Léo Pinheiro, o ministro teria pedido para que ele conversasse com os políticos influentes com quem o empreiteiro tinha contato.

VEJA teve acesso a um relatório produzido pelos investigadores da Operação Lava Jato e que demonstra, entre os telefones apreen­di­dos com Léo Pinheiro, que Benedito Gonçalves aparece marcando encontros com o empreiteiro em São Paulo e no Rio de Janeiro e combinando a ida à festa de aniversário de Toffoli. Em outra mensagem, um dia após a reeleição de Dilma Rousseff, o ministro do STJ comenta o resultado eleitoral e dá indicativos de que o empreiteiro, amigo íntimo do ex-presidente Lula, poderia trabalhar para que ele conseguisse ser nomeado para o STF, a maior corte do país. Benedito escreve a Léo Pinheiro: ‘Meu amigo, parabéns o ano 2015 começou ontem. Agora preciso da sua ajuda valiosa para meu projeto’.” –trecho da reportagem divulgada pela Revista Veja em 20 de maio de 2015 (Clique aqui para ler)

Após a prisão de Léo Pinheiro em novembro de 2014, a Polícia Federal produziu um relatório sobre as mensagens que foram encontradas em seus aparelhos celulares. De acordo com a PF, “Léo Pinheiro mantinha contatos frequentes com o ministro Benedito Gonçalves, a ponto de o mesmo solicitar atendimento para seu filho, tendo Léo Pinheiro escalado para tal tarefa o advogado da OAS, Bruno Brasil“.

Deltan Dallagnol, o deputado federal que cassado por unanimidade no TSE na última terça-feira, na época, era o chefe da força-tarefa de procuradores da Lava Jato de Curitiba.

A Lava Jato não chegou a realizar acusações formais contra o ministro Benedito Gonçalves.


Sobre a cassação: O ex-procurador Deltan Dallagnol foi cassado por unanimidade pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral na última terça-feira (16) em uma votação que, após a longa leitura do voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, durou menos de 2 minutos.

De acordo com Benedito Gonçalves, Dallagnol fraudou a Lei da Ficha Limpa ao pedir exoneração do cargo enquanto era alvo de cerca de 15 sindicâncias internas do Ministério Público (procedimento preliminar antes da instalação de um Processo Administrativo Disciplinar/PAD).

De acordo com a Lei da Ficha Limpa, o ex-procurador da Lava Jato deveria estar respondendo a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) para ter sua candidatura barrada, porém o relator do caso inaugurou uma interpretação de que Dallagnol teria deixado seu cargo de propósito para evitar que as sindicâncias internas virassem processos administrativos, e que essa intenção feria diretamente a lei.

A ação (movida pelos partidos PT, PCdoB, PV e PMN) chegou ao TSE através um recurso, pois havia sido rejeitada por unanimidade pelo TRE (instância inferior) em outubro de 2022 no deferimento da candidatura de Dallagnol.

Também fazia parte da ação a condenação do ex-procurador pelo TCUpor gastos com diárias e passagens na operação Lava Jato, mesmo com o Ministério Público Eleitoral (MPE) opinando pela regularidade da candidatura do deputado.

De acordo com o relator, a questão da condenação do TCU sobre as irregularidades nas diárias e passagens de integrantes da força-tarefa da Lava Jatonão incidiu inelegibilidade pois a decisão foi suspensa pela Justiça.

Com 344.917 votos, Deltan Dallagnolfoi o deputado federal eleito com mais votos no estado do Paraná nas eleições de 2022.

De acordo com os dados do TRE, que realizou uma nova contagem de votos (procedimento que dá andamento no caso) para saber que assumirá o posto de Dallagnol, sua cadeira será ocupada pelo Pastor Itamar Paim (PL), de 46 anos, natural de Paranaguá.

Paim é Pastor na 59ª Igreja do Evangelho Quadrangular, em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba e recebeu 47.052 votos nas eleições de 2022.

O primeiro suplente natural de Dallagnol seria o ex-deputado (7 mandatos entre os anos de 1991 e 2019) Luiz Carlos Hauly, porém ele não assumirá a cadeira por não ter conquistado o mínimo de votos necessários segundo critérios da legislação eleitoral (teve pouco mais de 11 mil votos).

Recurso no Supremo: Deltan Dallagnol já anunciou publicamente que recorrerá da decisão do Tribunal Superior Eleitoral que cassou o seu mandato no Supremo Tribunal Federal.

Na contagem informal, o deputado já sai com 4 votos contrários dos 10 ministros que hoje ocupam a Corte suprema do país.

Participaram da votação que cassou por unanimidade o mandato do deputado no TSE os ministros do Supremo Cármen Lúcia, Kassio Nunes Marques(ocupou a cadeira do ex-ministro Ricardo Lewandowski) e Alexandre de Moraes.

O ministro Gilmar Mendes já falou em entrevistas sobre o assunto e indicou que terá uma posição contrária à liberação da candidatura de Deltan Dallagnol.


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