BRASÍLIA, 25 de junho — Com o voto de Dias Toffoli, o Supremo Tribunal Federal, contrariando o Congresso, formou maioria de 6 votos a 3 pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal em todo o território brasileiro; o julgamento trata da constitucionalidade do artigo 28 da “Lei de Drogas” (11.343/2006), que considera crime “adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal (a matéria também está sendo analisada pelo Congresso através da PEC 45/23).
Na semana passada, ao devolver o processo após ter pedido vista do julgamento, Toffoli defendeu uma posição alternativa das duas correntes que estavam firmadas na Corte: Ele argumentou que a posse de pequenas quantidades de maconha não deveria ser considerada crime, mas que o sistema de Justiça criminal ainda deveria lidar com casos relacionados ao uso de drogas. Além disso, segundo Toffoli, a polícia deveria manter a competência para enquadrar portadores da droga.
Hoje, no retorno do julgamento, Toffoli apresentou um complemento de seu voto esclarecendo que votou sim pela descriminalização, argumentando que “nenhum usuário de [qualquer] droga deve ser criminalizado”, e disse que isso já havia sido definido pelo Congresso descriminalização na própria Lei de Drogas, de 2006.
Até o momento, votaram pela descriminalização os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Dias Toffoli.
Votaram contra a liberação do porte de maconha os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça e Nunes Marques.
Os próximos a votar serão os ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Desde o início, Dias Toffoli tinha uma posição conhecida de que o tema deveria ser resolvido pelo Congresso Nacional e pela ANVISA.
Fux já comentou sobre o assunto em uma entrevista à britânica BBC e argumentou que a sociedade deveria ser ouvida e que a descriminalização poderia atrapalhar ou acabar com o tráfico.
Cármen Lúcia além de já ter defendido que a maconha não seria uma questão de polícia, e sim de saúde pública, já participou de um evento dedicado à liberação e regulação da droga, o “maior encontro canábico do Brasil” em 2021.
Com a maioria formada, o próximo passo será estabelecer um parâmetro e a quantidade máxima que um usuário poderá portar.
Também é esperado que o STF trate a questão como cláusula pétrea, para que o Congresso não possa reformar a decisão.
Clique aqui para ler o processo (RE 635659) >
O caso que fez o tema chegar no Supremo foi um recurso do mecânico Francisco Benedito de Souza, que cumpria pena em Diadema (SP) por porte de arma de fogo e sofreu uma nova condenação após encontrarem 3 gramas de maconha dentro da cela dele.
Essa análise no Supremo teve início em 2015 e foi interrompida por um pedido de vista do ministro Teori Zavascki, que morreu em 2017 em um acidente aéreo.
Apesar de ser crime, hoje o porte de drogas para consumo pessoal no Brasil leva o usuário apenas a ser advertido, prestar de serviços à comunidade ou responder à aplicação de medidas educativas.
Com expectativa de liberação no Brasil, deixará de ser crime o porte de maconha, mas não deixará de ser crime a venda da droga (crime de tráfico continuará tendo uma pena de 5 a 20 anos de prisão).
Até o momento, vem se criando uma corrente, iniciada pelo ministro Moraes, sobre a liberação do porte de “até 60 gramas” de maconha ou o cultivo próprio de até 6 plantas fêmeas por usuário. Os ministros tambem analisarão o aumento sugerido por Barroso sobre o limite de “até 100 gramas” sob a justificativa do combate ao “hiperencarceramento de jovens”.
PESQUISA RECENTE: Afim de analisar o posicionamento do público sobre o tema, o DataFolha divulgou no fim do ano passado uma pesquisa dizendo que 72% dos brasileiros são contrários à liberação da venda da maconha para uso recreativo.
Na mesma pesquisa, 76% responderam que são favoráveis à liberação para uso medicinal de medicamentos que contenham substâncias da planta.
Dos que revelaram ter votado no presidente Lula na última eleição, 89% se disseram favoráveis ao uso medicinal de remédios com substâncias da planta da maconha. Dos que revelaram ter votado no ex-presidente Jair Bolsonaro, 69% se disseram favoráveis ao mesmo tipo de uso.
Quando perguntados se eles mesmos usariam “substâncias psicodélicas” como tratamento médico, 43% dos entrevistados disseram que não usariam, 36% usariam “com certeza” e 16% “talvez” usariam sob indicação de um médico de confiança.
A pesquisa fala que 10% dos maiores de 18 já usaram alguma substância alucinógena, sendo o LCD a droga mais citada.
Os números da pesquisa divergem (e muito) das últimas pesquisas de 2017 e 2012 da Fiocruz e da Unifesp, que apontavam que apenas 1,1% e 0,9%, da população já havia consumido algum tipo de droga.
Na última pesquisa do mesmo instituto sobre o tema, em 2018, 66% opinaram que a maconha deveria continuar sendo ilegal.
(Matéria em atualização)